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Regra fiscal de Temer desmonta serviços públicos e leva à privatização


Prioridade da gestão provisória de Michel Temer, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241 – que limita o crescimento dos gastos públicos –, pode ser responsável por retirar bilhões de reais do Orçamento de áreas como Saúde e Educação. Para o economista Guilherme Mello, a medida inviabiliza a prestação de serviços públicos e a garantia de direitos sociais pelo Estado. Segundo ele, a PEC abre as portas para a privatização, que beneficia empresários, mas penaliza a maior parte da população.


Anunciada pelo governo interino como a salvação para a economia nacional, a regra fiscal estabelece um novo teto para o gasto púbico, que terá como limite a despesa do ano anterior corrigida pela inflação. De acordo com a proposta, a restrição só se aplica aos gastos primários – ou seja, exclui as despesas de natureza financeira – e valerá por 20 anos. A PEC teve sua admissibilidade aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, na terça (9).


Um levantamento da Consultoria de Orçamentos, Fiscalização e Controle do Senado aponta que, caso a regra seja aprovada, o impacto nas áreas sociais será enorme. Segundo o estudo, sem os efeitos da PEC, o total de investimentos alocados e previstos para a Educação, nos anos de 2015, 2016, 2017 e 2018 é de R$ 382,7 bilhões. Com a PEC em vigor, os gastos do mesmo período ficariam em R$ 127,2 bilhões, o que significa R$ 255,5 bilhões a menos.

Na Saúde, a situação não seria muito diferente. Sem a restrição, os investimentos destes quatro anos seriam equivalentes a R$ 420,2 bilhões. Com a regra fiscal, passariam a R$ 252 bilhões –ou R$ 168,2 bilhões a menos. Keynesianismo fisiológico O governo insiste na medida, apesar de seu caráter impopular, alegando que prioriza o equilíbrio fiscal do governo. Segundo Guilherme Mello, professor da Unicamp, a justificativa não condiz com a prática da gestão, que oferece benesses a seus aliados, com custos para as contas públicas. “A PEC é uma construção que vai muito além de qualquer discurso de ajuste fiscal, porque, no curto prazo, não vai ter nenhum ajuste fiscal. No curto prazo, ao contrário, você está observando o que nós estamos chamando de keynesianismo fisiológico, que é a ideia de liberar verbas para parlamentares, aumentos, salários para servidores públicos, para ganhar apoio político. Não é uma medida de ajuste fiscal como aquilo que era cobrado, por exemplo, do governo anterior”, compara. Para ele, a regra fiscal de Temer se contrapõe às garantias sociais explicitadas na Constituição Federal. “É uma medida de reforma do Estado, praticamente de reforma da Constituição, dos objetivos mais gerais da Constituição, que é o provimento de serviços públicos, de Saúde, Educação, o direito à moradia, à cultura, etc. Porque, por essa regra, se você congela os gastos no nível atual, assim que a economia voltar a crescer – e ela há de voltar, porque não há recessão que não acabe –, a proporção do gasto público em relação ao PIB vai cair e, com isso, você vai inviabilizar cada vez mais o Sistema Único de Saúde, a universidade pública, a escola pública”, avalia. Contra o projeto da Constituição Cidadã Mello prevê que, ao reduzir o papel do Estado, a PEC abre as portas à iniciativa privada. “É um projeto de reforma do Estado que vai levar, em última instância, à privatização de praticamente todos os serviços púbicos, o que é muito positivo para as empresas que vão se beneficiar dessa privatização – elas vão ganhar muito dinheiro, vão abocanhar uma fatia do mercado cada vez maior – e é muito negativo para a população em geral”, diz. Segundo o economista, a PEC prejudica a maior parte dos brasileiros, aqueles que dependem do serviço público, que vai estar cada vez mais precarizado. “E quando [essa aparcela da população] tiver alguma renda, vai ter que gastar ela para comprar um serviço privado, também muito precário, como por exemplo essa ideia do plano de saúde popular”, afirma. Questionado se a PEC – tratada como tema fiscal –, terminaria por engessar a atuação dos governos, independentemente do projeto aprovado nas urnas, Mello respondeu: “A ideia é um pouco essa, porque você vai fazer reformas na Constituição, o que exige um quórum muito qualificado. E essas reformas constitucionais são de difícil reversão. Então você usa o momento de crise, usa o fato de ter um governo não eleito e aprova essas medidas para depois inviabilizar qualquer tipo de retomada do projeto anterior, do projeto da Constituição, de um estado de bem-estar social”. O fantasioso mundo de Meirelles Na contramão daquilo que indicam estudos e projeções, o governo tem repetido que o teto de gastos irá melhorar a vida das pessoas, apesar de representar o corte drástico de despesas com Saúde, Educação, benefícios sociais e investimentos. “Seguimos convictos de que o limite constitucional de gastos federais será aprovado pelo Congresso no menor prazo possível. O resultado será uma transformação duradoura na trajetória das contas públicas, garantindo o realismo e o equilíbrio estrutural fundamentais para que o Brasil retome o desenvolvimento sustentável e ofereça um melhor padrão de vida a todos. Essa, afinal, deve sempre ser a meta de toda política econômica”, escreveu o ministro da Fazenda Henrique Meirelles, na Folha de S. Paulo do último domingo.

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